Na semana passada, tive uma conversa com um amigo, lá em casa, chamado Lúcio Anneo Sêneca. Os mais próximos lhe chamam de Sêneca. Tal encontro só foi possível, pois abri o seu livro "Da tranquilidade da alma". Então, imaginei que estava a dialogar com esse grande pensador da Antiguidade.
_Senta aí, Sêneca! A casa é sua rapaz. - minha intenção com essas palavras era deixá-lo bem à vontade, para iniciarmos uma conversa.
_ Muito obrigado, Marco... - respondeu-me ele.
_ Sêneca, rapaz, me tire uma dúvida, o que você acha de as pessoas ultimamente falar tanta coisa e não fazerem o que falam? Uma total enganação...
_ Baseado em meus estudos, acredito ser melhor contemplar as próprias coisas e falar movido por elas, emitindo palavras adequadas aos fatos, de modo que, para onde quer que levem, o discurso siga esta espontaneidade.- falou-me ele com um ar de seriedade e contemplação.
_ Ah, meu nobre, quer dizer que em seus ensinamentos, você preza pela espontaneidade de nossas ações para evitar as preocupações do dia-a-dia?- pergunteio-o ansiosamente.
_Não me detendo em detalhes, atento para o fato de que, em minhas preocupações, sou acompanhado por certa timidez cheia de boas intenções. Temo me inclinar paulatinamente para elas ou, o que é mais preocupante, ficar sempre pendente e que talvez isso seja mais forte do que eu havia previsto. Isso porque as coisas costumeiras nos parecem familiares e sempre são julgadas de modo benevolente.
_ Pois é, Sêneca, rapaz, você falou bonito, concordo com tudo que você acabou de falar. Hoje em dia, para mim, a minha maior preocupação é ver que tem muita gente querendo ser o que não é, passando por cima dos outros a todo custo...
Sêneca, com seu semblante confiante me disse:
_ Penso que muitos poderiam ter chegado à sabedoria se não pensassem já serem sábios,se não tivessem dissimulado para si mesmo algumas coisas e se não tivessem passado por outras tantas com os olhos fechados.
_ Com relação, aos muitos e muitos seres do mundo que estão sofrendo neste momento, por várias causas distintas, Sêneca, qual seria a sua mensagem?
Após um suspiro intenso, ele disse:
_ Considera que os prisioneiros apenas no princípio se afligem com as algemas e os grilhões que impedem seus passos. Porém, quando resolvem não mais irritarem e se propõem a suportá-los, a necessidade lhes ensina a levá-los com fortaleza, e o costume, com facilidade. De fato, em qualquer gênero de vida, encontrarás distrações, compensações e deleites, desde que queiras avaliar com leves os teus males, em lugar de fazê-los insuportáveis.
_ Para encerrar a nossa conversa, me diz amigo Sêneca, uma mensagem final para que eu possa refletir nesta semana?
Ele me respondeu:
_ Lançando mão de uma imagem que expresse o que sinto, digo que não me cansa a tempestade, mas, sim, a náusea. Portanto, afasta o que quer que seja este mal e socorre ao náufrago que já avista a terra.
_ Valeu, Sêneca!- despedi-me dele, emocionado com tanta sabedoria.
Após a nossa conversa, pus de volta o livro do amigo na estante. Os seus escritos aqui colocados até pareciam que estavam falando comigo, pois seus ensinamentos são lições para toda uma vida...
Marco Valério Gomes Batista Gonçalves.
Fonte: Sêneca, L. A. Da tranquilidade da alma, L&PM Editores, 2009.
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